segunda-feira, 28 de outubro de 2013

ELES NÃO DEFENDEM A CIÊNCIA, MAS A CRUELDADE

Reconheço que sofismar é algo que, na maioria das vezes, requer talento e competência.  Não é para qualquer imbecil. Pois do contrário fica um monte de palavras e ideias sem fundamento atiradas ao léu. Embora reconheça a inteligência de quem sabe induzir o locutor a refletir de modo errado, não vejo o sofisma com muita simpatia, porque em geral vem acompanhado de uma dose cavalar de sordidez.  
Digo isto porque foi com imensa revolta e  indignação que li e vi os que na mídia defenderam o uso de cães da raça beagle e outros animais como cobaias para experimentos em laboratórios.  Houve um cientista (ou alguém que assim se disse) que afirmou que aquela atitude dos salvadores em relação aos cães martirizados pelo infame laboratório prejudicava a pesquisa contra o câncer.  Gozado: não sabia que câncer se combatia com cosméticos.  Este, cientista ou não, se enquadra entre os sofistas idiotas - ou, se é gênio, é do mal, e, sinceramente, um gênio bastante babaca nos argumentos.  Um leitor se manifestou n' "A Folha" e, achando que dizia algo pejado de extrema sabedoria e conhecimento técnico, chamou atenção para o fato de que era preciso que entendêssemos que são cães que não são de estimação, mas para utilização como cobaias.  Se o argumento vale, os sádicos amanhã vão fazer atrocidades com crianças pobres, alegando que não são crianças de estimação, mas criadas para fins de pesquisa.  Sugeriria que a mãe do pústula, que certamente é uma criatura sem nenhum valor estimativo, seja colocada no lugar dos torturados cachorrinhos, porque não tenho dúvida de que é uma puta da pior qualidade, dessas que armam arapucas para seus "clientes" serem roubados ou furtados.  Dois pesquisadores com cara de puxa-saco de patrão, em entrevista ao "Fantástico", alegaram a impossibilidade de se fazerem experiências sem animais, mas foram contestados por um biólogo inglês renomado que mostrou que há, sim, como trabalhar em pesquisas usando células de tecidos humanos, o que pouparia até os ratos indefesos e dóceis que os algozes utilizam em suas atrocidades.  O Ernesto Paglia, excelente garoto de recados dos Marinho, bem que tentou que os entrevistados que se opõem às práticas de perversidades adotassem outra posição, mas estes últimos foram firmes e seguros em suas convicções.
Ver gente defendendo o desrespeito à vida e à integridade física e psíquica dos indefesos e inocentes animais dá uma profunda tristeza de viver num mundo onde um número considerável de pessoas não respeita a vida, a dor e o sofrimento que não ocorre em si próprias. Não vou jamais dizer que são assim porque são humanos: a Nicole Puzzi, a Luíza Mel, os ativistas que salvaram os animais e a comissão de deputados federais que solicitou o fechamento do laboratório durante as investigações também são seres humanos, mas parecem de estirpe bastante diferente:  compassivos, lutadores, heroicos,  corajosos, compreensivos, sensíveis, avessos a creueldades e mais enquadrados ao pensamento de boa índole de Alberto Schweitzer, Francisco de Assis, Mahatma Ghandii, outros famosos e não-famosos dotados de bondade e de sangue nas veias.
O mundo está cheio de psicopatas perversos, e o número de soldados que os líderes mais cruéis da história arrebanharam para os seus empreendimentos expansionistas bem o prova, e aqueles que preconizam o uso dos bichinhos para cobaias nos trabalhos da Ciência são como os militares da SS e da Gestapo, como os perversos guerreiros que se apossam dos despojos de guerra entre estupros, matanças, humilhações, torturas, atos hediondos e lamentáveis.  Alegam que fazer sofrer os animais é o meio mais fácil, prático e barato, mas na verdade o que os fascina é matar, causar dor, sofrimento lancinate, e se comprazem em martirizar qualquer criatura mais fraca e inapta para a autodefesa, num exercício de maldade e sadismo que lhes é indispensável e essencial como o ar que respiram.  São pessoas horripilantes, de uma crueldade sem medidas, de uma demonicidade que não os difere dos grandes carrascos do crime ou mesmo da lei, quando esta se põe ao lado dos mais iníquos objetivos.
São pessoas que sentem um prazer insano em cortar, decepar, mutilar, retalhar, envenenar, capazes de ficarem horas intermináveis a se comprazer em observar as mais longas e deploráveis cenas de dor e sofrimento. 

Barão da Mata

quinta-feira, 22 de agosto de 2013

TEMOS A TV QUE MERECEMOS?



Alguém é capaz de explicar em que absurdo se transformou a programação da TV aberta brasileira? Foi assim, meio depressa, meio devagar. E a gente sempre querendo crer no poder de escolha do telespectador. Quando acordamos, aquele velho e conhecido cubo luminoso tinha virado uma película delgada. Mas não é sua aparência, o que preocupa, é realmente o conteúdo.

 

Digamos que numa quina da tela, está o Pânico. O programa, que outrora carregava no humor non sense, carregou tanto que ficou ininteligível, e perdeu a graça. 

 

No outro canto, o retorno de João Kleber, com força total! ele com seus testes de fidelidade acima de qualquer suspeita.

 

As velhas novelas continuam monopolizando assunto por aí, como de costume. Ganharam outra dinâmica, é verdade. Os dramas vão e vêm com maior velocidade. Mas para resumir, atualmente, enquanto anseiam pelo beijo gay, vão testando a tolerância e vencendo, aos poucos, a resistência da audiência mais tradicional e conservadora.

 

O incrível mesmo encontramos na TV do Bispo. Lá vem o seu reality show rural em que os participantes são celebridades. O programa tornou-se, recentemente, uma tempestade de cusparadas na cara entre os "artistas". Coisa de pedir socorro ao Ratinho, de envergonhar qualquer um, menos a equipe do programa, que exibe, satisfeita, toda a baixaria, como se fosse uma entrevista do Amaury Junior no Copacabana Palace.

 

O mais assustador ainda está por vir. Não parece óbvio  que as "celebridades", ainda que não sejam artistas de verdade e sim oportunistas despreparados, deveriam prezar por sua imagem e manter assim a "boa fama", com o objetivo de construir uma carreira de sucesso? Então, por que, num programa de "famosos", esses indivíduos escancaram este comportamento sub-humano, mesmo sabendo que podem estar sendo observados por milhares, até milhões de pessoas?

 

Pois, amigos, ainda que conhecedor da predileção do Homem pelo sensacionalismo e pela polêmica, sempre acreditei que havia um limite para isto. Mas qual foi minha surpresa quando descobri que o espetáculo de cusparada alavancou a audiência do programa, dando sinal verde para os camponeses da TV usarem e abusarem da saliva.

 

Hipocrisia? Falso moralismo? Será mesmo? Pela primeira vez na vida me vejo do outro lado da questão. E todo aquele papo de que só assiste a porcarias quem quer, virou balela. Diante da falta de opções, o controle remoto virou uma arma sem munição. Ao menos para aqueles que não podem pagar para ter uma programação por assinatura.

 

Não quero, de forma alguma, propor uma Tropicália às avessas para pedir a volta da censura. Liberdade de expressão sempre. Isto não é uma questão de censura. É de bom senso.

 

Leônidas Falcão


 

 

 


 Cartaz das manifestações de 20/06/13 no Rio de Janeiro

 

 

sábado, 20 de julho de 2013

É NECESSÁRIO INVESTIGAR CRITERIOSAMENTE OS ATOS DE VANDALISMO

É preciso muito cuidado, sobretudo por parte das autoridades, na hora de avaliar sobre os atos de vandalismo praticados por delinquentes oportunistas, nas manifestações que reivindicam políticas públicas e  maior (ou alguma) seriedade na atuação dos políticos. É necessário separar o joio do trigo com muito esmero e muita cautela, porque, em primeiro plano, penso que quem tem algo para reivindicar e quer os seus pleitos atendidos, não sai por aí depredando patrimônio público ou privado.  Perder a credibilidade, creio eu, é tudo o que os manifestantes - e falo manifestantes de verdade - não querem.  Isto voltaria a opinião pública contra eles, daria munição aos governos para tomarem atitudes duras e drásticas, e eu lhes garanto que quem se engaja na luta em que se engajaram aqueles jovens não quer que tais coisas aconteçam.
Oportunistas e provocadores há em toda parte, e a história bem sabe disto.  O "cabo" Anselmo (soldado de primeira classe confundido por um jornalista com cabo por suas divisas), por exemplo, é um caso antológico que o Brasil conheceu.  Sublevou a classe dos marinheiros a pretexto de obter melhores condições para a categoria, mas na verdade fora incumbido (dizem que pela Cia) de ajudar a desestabilizar o governo Jango, em decorrência do perfil esquerdista do presidente.
O "Jornal do Brasil", em um de seus últimos anos de existência, narrou que no período ditatorial um mercenário americano viera ao Brasil com três missões.  Uma delas não me vem à memória, mas as outras eram: explodir a catedral da Sé, em São Paulo, e o próprio Consulado Americano.  Finalidade: pressionar os militares brasileiros a serem ainda mais cruéis com os comunistas, os guerrilheiros e os mais radicais opositores do regime.  O mesmo objetivo tinha, segundo dizem,  o brigadeiro Miguel Burnier, que conforme algumas versões ordenara o Capitão Sérgio Carvalho a explodir o gasômetro do Rio de Janeiro, às dezoito horas, momento de pique de trabalhadores querendo voltar para casa, com o objetivo de que a culpa caísse sobre os ombros dos mesmos lutadores contrários à ditadura que citei, com o fito de justificar práticas ainda mais duras contra aqueles. 
Oportunistas, vândalos e marginais  surgem em todos os movimentos, pois são elementos que vivem do caos ou a ele são afeitos.  O próprio movimento dos sem-terra, no tempo em que foi mais atuante, contou com a participação de muitos desocupados, aventureiros, gente desempregada de todas as profissões e que nunca cultivara um pé de couve sequer.  Mas eram, repito, oportunistas.
Se há provocadores, gente encarregada de atos criminosos por alguma ou algumas pessoas ligadas a partidos ou governos, não se pode descartar que os governantes podem perfeitamente não ter conhecimento de quem seriam estes mandantes, da mesma forma como Gregório Fortunato atentou contra Carlos Lacerda sem o conhecimento de Getúlio Vargas.  Assim, não venho aqui acusar nenhum  político, autoridade ou mandatário, mas todos sabem muito bem que há eminências pardas que são mais realistas do que os reis e vão às raias da imundície e da perversidade para não verem ameaçadas as benesses que o trânsito dentro do poder lhes traz.
Gente ligada ao crime organizado também pode estar promovendo saques e destruições, obviamente com o intuito de desestabilizar a ordem sócio-política, porque se tornam fortes num clima de tumultos e confrontos entre o poder público e cidadãos, fazendo logicamente estes dois últimos enfraquecidos. 
Não podemos esquecer a existência dos vândalos inatos, que os são por excelência, e de ladrões independentes, que agem de moto próprio, sem a orientação de ninguém.
Assim, é preciso que sejam efetuadas mais prisões, que alguma medida de emergência seja tomada para que os depredadores e ladrões não sejam liberados pouco tempo após a detenção, para que sejam realizadas investigações mais acuradas sobre essas pessoas e deste modo os legítimos manifestantes não caiam no desgaste e no descrédito perante a opinião pública, porque isto só faria mal à própria sociedade como um todo.

Barão da Mata


sábado, 22 de junho de 2013

OSTENSIVA MATANÇA DE GATOS EM NITERÓI: PRESSIONEM O MINISTÉRIO PÚBLICO A TOMAR MEDIDAS

Na rua Botânico Frederico Guilherme Albuquerque, ou antiga rua 13, em Maravista, Itaipu, Niterói, os gatos de rua são sistematicamente envenenados, morrendo no mínimo um a cada semana.  Enviei há mais ou menos um ano um e-mail ao Ministério Público do Estado pedindo investigação e nem sequer recebi resposta.  O que indica que não haverá jamais qualquer investigação, porque, na opinião dos Exmos. Srs. procuradores estaduais, a vida dos animais é absolutamente irrelevante. 
Pediria a quem  seja afeito aos bichinhos que ajudem a pressionar a Procuradoria do Estado a proceder às averiguações que seriam pertinentes.  O site do órgão é www.mp.rj.gov.br   .    A rua é bastante pequena, uma travessa: se houver boa-vontade da Procuradoria, os bestiais, malditos e asquerosos assassinos serão facilmente descobertos.
Há pessoas que na mesma rua se esmeram em alimentar e cuidar dos animais abandonados, e a crueldade dos covardes e impudentes matadores lhes traz (e a mim também, que não moro lá) uma frustração, uma tristeza,  revolta e desolação que só quem ama os animais pode avaliar.

Por favor, compartilhem: alguma providência precisa ser tomada.   Aproveitem enquanto o MPE ainda pode investigar.


Barão da Mata 

ENQUANTO A NSA INVESTIGA OS PENSADORES

Deixem-me curtir o momento. Este orgulho inédito de ser brasileiro. Hoje, não falemos de amanhã. Vamos falar da hesitação patética de Paes e Cabral,atônitos, em dar as caras. Vamos rir da Dilma pedindo socorro ao sabichão Lula. Vamos ignorar a fala ensaiada desses políticos desqualificados e vamos saborear as televisões insistindo, ontem, em mostrar somente as depredações, preterindo a multidão pacífica e hoje, tendo que inverter o discurso, diante da inevitável repercussão. Hoje, não vamos pensar no final da história, porque o meio está bom demais.

Leônidas Falcão

NOME DE RUA DO DIA

Este espaço é dedicado a lançar um pouco de luz aos incontáveis nomes que vemos, ouvimos e até mesmo dizemos no dia a dia, percorrendo as ruas do Rio de Janeiro, muitas vezes sem ter a mínima ideia de quem está recebendo homenagem e até mesmo se aquela é justa. Afinal de contas, os heróis de nossa história estão sempre mais para Macunaíma, e mais recentemente, Tiririca.


Hoje:Alice Tibiriçá


Localização: bairro Vila da Penha, zona norte.

Homenagem justa?  SIM

O nome de Alice Tibiriçá está fortemente atrelado à dedicação pelas causas médico-sociais, culturais e à luta pelos direitos da mulher. É impossível, contudo, dissociar do contexto político as atividades engajadas que ela exerceu de forma tão eficiente.

Nasceu em 09/01/1886, com o nome de Alice Toledo Ribas, em Ouro Preto, MG, onde viveu até 1898, quando mudou-se com a família para o bairro de Laranjeiras, no Rio de Janeiro. Durante o ano seguinte, perdeu os pais e mudou-se para São Paulo para viver com as tias.

Em 1912, casou-se com João Tibiriçá Neto (filho do senador Jorge Tibiriçá), de quem herdou o sobrenome.

Mudou-se para o Maranhão, acompanhando o marido, que houvera sido encarregado da construção de uma estrada de ferro naquele Estado. Durante este período, deu início a uma campanha de combate à lepra, que logo se expandiu por todo o país.

De volta ao Rio, em 1915, deu continuidade às iniciativas, liderando o pleito para que a enfermidade passasse a ser chamada de hanseníase. Até que, em 1926, criou a Sociedade de Assistência às Crianças Lázaras, que mais tarde se tornou Sociedade de Assistência aos Lázaros e Defesa contra a Lepra (SALDCL). Sempre assinalando tratar-se de uma obra de solidariedade e não de caridade, lançou perto de uma centena de agremiações filiadas por todo o país.


Em 1929, foi eleita presidente da Federação das Sociedades, e graças a seu empenho, em 1933 realizou-se no Rio de Janeiro (então Distrito Federal) a Conferência para a Uniformização da Campanha contra a Lepra, que resultou um Plano Geral de Combate à Hanseníase.

Por conta de sua liderança, passou a lidar com confrontos de natureza política. Presenciou o retrocesso no tratamento de leprosos, quando em 1932, por responsabilidade do diretor da Inspetoria de Moléstias Infecciosas, F. Sales Gomes, todo o trabalho de humanização no tratamento da hanseníase foi substituído por medidas drásticas, como o isolamento dos doentes. Nesta época, ela escreveu um livro, “Como eu vejo o problema da lepra”, editado em 1934, através do qual denunciou os maus-tratos sofridos pelos doentes.

 Ainda na área da medicina social, conseguiu a unificação das entidades de combate à tuberculose, criando, a pedido dos médicos psiquiatras, a Sociedade de Amparo aos Psicopatas, e uma entidade de apoio aos cegos.

Por sua dedicação, recebeu o reconhecimento do Comitê de Higiene da Liga das Nações Unidas.  Por Austregésilo de Athaíde, foi chamada de “santa leiga”.

Alice também se destacou na luta pelos direitos das mulheres. Representou a seção paulista da Federação Brasileira pelo Progresso Feminino no II Congresso Internacional Feminista, realizado no Rio de Janeiro em 1931.

Em 1945, separada do marido, Alice lançou-se em campanha contra a carestia, com o apoio do Partido Comunista do Brasil (PCB). Ao mesmo tempo, em 1946, dirigiu o Instituto Feminino de Serviço Construtivo e fez realizar, pela primeira vez no Brasil, a 8 de março de 1947, as comemorações do Dia Internacional da Mulher.

Foi a primeira presidente da Federação de Mulheres do Brasil, entidade fundada em 1949 que centralizava as atividades das diversas organizações de mulheres do país, exercendo o cargo até a sua morte, no ano seguinte.

Nos últimos anos de vida, ainda participou ativamente da campanha “O petróleo é nosso”, ocupando a vice-presidência do Centro Nacional de Estudos e Defesa do Petróleo. Destacou-se como grande oradora e conhecedora do problema, e chegou a ser presa em agosto de 1949,  numa passeata promovida pela associação de Mulheres de São Paulo para anunciar o Congresso da Paz. Foi levada para São Roque e, enquanto esteve presa, desenvolveu-se intensa campanha “Onde está Alice?”. O último ato público de que participou foi a comemoração do Dia Internacional da Mulher, em 8 de março de 1950, aos 64 anos. Faleceu, vítima de câncer, em 8 de junho do mesmo ano.

Leônidas Falcão

O ATELIÊ

Pela fresta estreita de janela, uma brisa lança em vôo a densa cortina, deixando assim que se mostrem tubos, latas, penas e cavaletes tombados. No alto de uma estante metálica, descansam oito esculturas, formas talhadas em madeira e sabão. Enquanto em outro canto quase ao breu, um enorme vaso estilizado abriga flores mortas, cujas pétalas secas se espalham no chão. 

Já mais próximo à janela, levanta-se uma única tela descoberta, borrada e interminada, como se vítima fosse de um súbito abandono e condenada a perecer assim, pela metade. Naquele painel surge uma cor, que vem dos cantos superiores, traçada para baixo. Vista na chama e no ouro, é o tom da sorte de se ver nascer mais um dia. E ganhar mais outro pra simplesmente viver.

Com o azul, pintou matas, serras e florestas. Do açúcar fez caramelo. Pois é o mesmo tal de amarelo, escorrido para o centro da pintura, que celebra uma nova mistura, do encontro com um novo pigmento.  

Uma outra cor, um carmim escaldante, dos batons baratos, acostumados a corar no espelho as bocas cheias de paixão. Arrasta-se de baixo para o meio este vermelho. É o sangue que pulsa, é vida. Não se duvida que casado a um anil suave, coloriu de lilás uma mínima camisola, incapaz de esconder os contornos de um corpo perfeito de mulher.

Todavia, jazem ali, mescladas naquela tela. E por mais belas que sejam, não produziram juntas mais que um marrom. Um marrom sem encantos, distante da pele ardente da mulata estonteante. Pode até lembrar o café perfumado das manhãs apressadas, ou quem sabe, ao máximo, um saboroso chocolate das noites frias da segunda infância.

Irremediavelmente misturadas e feias, num cromo melancólico e saudosista. É como se imaginam e lamentam. - Não deveriam deixar o azul - não param de lamuriar. Este, sim, segue reinando no alto dos dias de sol e das noites de lua, tom sobre tom.

Pois nesta tarde, finalmente, invertem-se os sentidos das pinceladas. E para tal, bastava assim querer enxergar. Do centro, onde são lama, se afastam para as extremidades, onde são únicas, acesas. E caminham assim, como um milagre, cores vivas outra vez, ainda meio desbotadas, solvidas por esparsas gotas de lágrima, por culpa da separação. 
 
Leônidas Falcão